quarta-feira, 2 de setembro de 2015

Minha estante atual - Parte I

{Meus atuais companheiros}


Calculo que eu tenha hoje em dia no apartamento do Rio cerca de 600 livros. Na casa dos meus pais devem estar guardados outros 200 livros meus.
São estimativas bastante grosseiras e acredito que a margem de erro jogaria esse número para cima, não para baixo. Então, imagine escolher uma pequena quantidade desses livros para acompanhá-la(o) durante um ano de moradia no exterior. Lógico que você sempre pode comprar novos livros, mas quando se vai morar em uma cidade pequena de um país cuja língua não se domina, mesmo as opções de livros importados são bastante reduzidas. Logo, é preciso escolher, ao menos, quais serão as leituras que você terá garantido para o período antes de encontrar uma livraria com acervo decente em algum idioma conhecido.

Esse era o meu dilema quando tive que botar minha vida em malas para serem despachadas para Erlangen. Para não enlouquecer – ou pelo menos enlouquecer menos – estipulei um limite de 15 volumes. Sem me apegar aos meus preferidos, a principal regra era que fossem todos livros que eu ainda não tivesse lido. É sobre eles (que aparecem na foto acima) que pretendo falar hoje. Começarei da esquerda para a direita.

1. The Poppy, de Nicholas J. Saunders
Comprei o livro na Austrália, quando estava voltando de Timor-Leste. Confesso que papoulas são flores que me impressionam muito. Em primeiro lugar, pelo seu simbolismo em relação à guerra: por serem muito efêmeras e por existirem campos de papoula em alguns dos lugares onde se travaram batalhas na Primeira Grande Guerra, elas são até hoje usadas em lapelas ou desenhos para homenagear os soldados mortos. Em segundo lugar, por ser a fonte de onde se retira a seiva para a produção do ópio (e consequentemente de opiáceos como a morfina e heroína) é uma planta que fascina e assusta, necessária para sanar a dor e combatida à foice em países como o Afeganistão. Por tudo isso, fiquei curiosa em ler mais sobre a planta.

2. Peregrinação de Enmanuel Jhesus, de Pedro Rosa Mendes
Na verdade, não sei muito sobre o que é o livro. Porém, se você tentar pesquisar sobre livros ligados a Timor-Leste, como fiz antes de visitar o país, este é um dos que primeiro aparecerão na sua pesquisa. O autor é um jornalista português, que já foi chefe da Agência Lusa em Timor e tem uma vasta experiência em áreas de conflito. Alguns meses atrás acabei achando o livro na estante de uma livraria no Rio, mas não era possível achá-lo quando o procurei pela primeira vez. O meu exemplar comprei numa pequena livraria em Díli.

3. O Homem que Amava os Cachorros, de Leonardo Padua
O livro fez enorme sucesso quando foi lançado e o autor cubano deu algumas entrevistas inclusive para canais brasileiros na época da publicação. Ele costuma ser muito elogiado pelos leitores e se baseia num fato histórico, o assassinato de Trotsky no México, para narrar histórias que envolvem o assassino. Ao que parece, vai se aproveitando desse fio para repensar o próprio comunismo.

4. 18 Dias, de Matias Spektor
Comprei o livro logo que foi lançado e ouvi falar até que foram feitas algumas modificações nas edições posteriores. O autor é um dos grandes pesquisadores atuais de política externa brasileira e escreve uma coluna para a Folha de São Paulo. Com esse currículo, o tema ganha ainda mais peso: trata-se do relato dos movimentos feitos pelo então governo Fernando Henrique Cardoso, logo após a vitória de Lula nas eleições, para que os Estados Unidos recebessem bem o sucessor na presidência. Ao que parece, a pesquisa para o livro contou com vários depoimentos do alto escalão. Acho que é uma leitura interessante para qualquer um que queira entender a política externa brasileira atual e os próprios mecanismos que regem a construção de políticas externas de forma geral.

5. A Rainha Ginga, de José Eduardo Agualusa
Depois de ler Milagrário Pessoal, cai de amores pelo Agualusa. A Rainha Ginga é o romance mais recente do autor angolano e envolve a personagem histórica que dá nome ao título. Minha expectativa é enorme e, se você já leu qualquer coisa desse autor (que escreve às segundas-feiras n’O Globo), deve imaginar como eu que a escrita sedutora dele não pode dar em algo ruim. O livro parece trazer relatos de aventuras fantásticas, ao ponto do autor falar em uma entrevista que, ao descrever fatos reais insólitos, ficava com medo que as pessoas apontassem justamente na realidade os exageros da história. Estou guardando a leitura do livro como quem guarda o pedaço mais gostoso de um prato para a última garfada.

6. Construir al Enemigo, de Umberto Eco
Outro critério que tentei usar na escolha dos livros foi trazer ao menos um título em cada idioma que domino para não perder a prática. Foi um pouco assim que este livro veio parar na seleção. Ele foi comprado na minha última viagem a Bariloche, num impulso motivado pelo título e pelo autor. Umberto Eco é um grande romancista (autor do famosíssimo O Nome da Rosa) e acadêmico na área de semiótica. Alguns de seus livros, como Apocalípticos e Integrados, são obrigatórios para qualquer pessoa que pretende estudar comunicação a sério. Some-se a isso o fato de que a construção do inimigo, ou a própria compreensão do que é o “eu” em contraposição ao “outro”, é um dos principais temas de estudo de relações internacionais. Ou seja, este livro que reúne textos dispersos de Eco mexe com grande parte daquilo que busquei estudar durante minha vida acadêmica. Convenhamos que foi um impulso perdoável.

7. Pós-Guerra: uma história da Europa desde 1945, de Tony Judt
Li dois capítulos deste livro durante as aulas de História da faculdade de comunicação. Além de extremamente interessante, é muito bem escrito. Passa por assuntos diretamente políticos, como todo o encaminhamento para a abertura dos países do leste europeu no final dos anos 80, até aspectos culturais, como o baby boom do pós-guerra e a revolução cultural resultante de uma população majoritariamente jovem. Como ele é um pequeno tijolo, a continuação da leitura foi sempre sendo adiada. Trouxe na esperança de que a hora seja agora.

8. Serena, de Ian McEwan
Este livro veio na mala porque era o que eu estava lendo no momento em que deixamos o Brasil. Se trata de um romance de espionagem, um pouco aos moldes de O Fator Humano, de Graham Greene, em que o serviço secreto é mais caracterizado pelo seu lado lento e burocrático do que pela agilidade da vida glamorosa de espiões à la 007. Tenho sempre boa expectativa com tudo que é escrito pelo Ian McEwan, mas o livro não me empolgou. Em parte, o aspecto que achei mais interessante foi a descrição dos costumes da época, inclusive da liberação sexual que a protagonista vai experimentando ao longo do livro. Entretanto, esse tema é melhor retratado em outro romance do autor, o Na Praia, que se passa durante uma noite de núpcias no começo dos anos 60. Da mesma forma, o ápice de Serena está na descoberta da metalinguagem (estamos lendo um livro dentro de outro livro). Esse não é um recurso novo na obra de McEwan; pelo contrário, é o ponto forte de Reparação, seu romance de maior sucesso. Porém, em Reparação, a revelação da metalinguagem traz revelações sobre a trama que são arrebatadoras. Em Serena o efeito não é tão impactante, embora não deixe de ser bem elaborado. Em resumo, não é um livro ruim, mas está longe de ser o melhor do autor.

9. Gabriela Cravo e Canela, de Jorge Amado
Antes de tudo, é preciso dizer que fui batizada em homenagem ao romance. Meus pais queriam um nome "bem brasileiro” e foi assim que me chamei Gabriela. Por isso, sempre tive curiosidade com o livro. Um dia, procurando o exemplar que minha mãe disse ter na biblioteca da casa dos meus pais, descobrimos que o livro havia sumido. Foi quando me dei ao trabalho de comprar um para colocar no meu acervo, e lá ele ficou sem receber muita atenção. Entretanto, sempre foi um livro que me fascinou pelo contexto pessoal. Talvez seja justamente por isso que tenho medo de lê-lo e me decepcionar. A história é velha conhecida de qualquer pessoa em um país lusófono que tenha acesso à televisão. Minha curiosidade (e temor) é saber como o livro conta a história já conhecida.

10. O Planeta dos Macacos, de Pierre Boulle
Quando vi a versão para o cinema dos anos 60 há uns dois anos, fiquei muito impressionada com a trama. É extremamente inteligente e imediatamente pensei que, se o filme era tão bom, o livro deveria ser ainda melhor. Algumas coisas me incomodavam por estarem mal explicadas e, quando pesquisei sobre o livro, descobri que os problemas que via na versão cinematográfica não se repetiam na obra original. Desde então, comecei a querer o livro, mas pensava em comprá-lo em inglês (só depois me dei conta de que o livro foi escrito originalmente em francês). Até que, não faz muito tempo, dei de cara numa livraria com esta nova versão da obra de Pierre Boulle em português. A nova edição traz a(o) leitor(a) uma entrevista e um perfil do autor, assim como um posfácio que situa O Planeta dos Macacos num contexto maior de produção de ficção científica. O livro vale muito a pena pelo romance e pelos textos complementares. Pretendo voltar a falar nele num futuro post.

Pensando no tema do livro, talvez você goste de ler (ou reler) o texto “Macacos” publicado anteriormente aqui no blog.

11. A Flecha de Deus, de Chinua Achebe
Quando ouvi falar pela primeira vez de Chinua Achebe em uma aula sobre África no mestrado, corri para comprar alguns livros seus. O escritor nigeriano tem, além de romances, pelo menos um livro de ensaios chamado A Educação de Uma Criança Sob o Protetorado Britânico que é imperdível. É possível encontrar muito eco de sua obra, assim como referências explícitas, no livro Americanah, da escritora nigeriana contemporânea Chimamanda Adichie. A Flecha de Deus fala sobre o choque de visões dos colonizadores ingleses e dos moradores de uma aldeia nigeriana, que tentam entender uns aos outros para se manterem no lugar, seja pela expansão ou pela sobrevivência. O enredo me empolga bastante e a forma direta da escrita de Achebe deve fazer deste romance um bom livro.

12. Contos do Nascer da Terra, de Mia Couto
Na noite do último Natal, num momento que estava na cozinha com meu tio ele me disse: “li um livro que tem uma criança que toda vez que houve o final de uma história pergunta “e depois?”. Lembrei de você quando era criança”. Quando ele me disse que era um livro do Mia Couto, fiquei especialmente feliz. É sempre bom ser lembrada por algo que nós mesmos admiramos. Pouco depois do meu aniversário, meu pai chegou em casa com um exemplar de Contos do Nascer da Terra. Era um presente enviado pelo meu tio. Não tenho muita idéia sobre o enredo do livro, mas tenho certeza que vou adorar descobrir.

13. Solar, de Ian McEwan
O livro foi presente de um amigo que tinha acabado de lê-lo e foi entregue com muitas recomendações positivas. Pelo que entendi, trata-se da história de um cientista que estuda mudanças climáticas e passa a maior parte do tempo mostrando as incongruências do próprio raciocínio científico. Como adoro protagonistas cínicos, tem grande chance de me empolgar. Porém, esse deve ficar no final da fila; no momento estou dando um tempo de obras do Ian McEwan para variar um pouco.

14. A Peste & O Estrangeiro, de Albert Camus
Até hoje o único livro que li de Camus foi o menos famoso, mas nem por isso menos certeiro, Os Justos. Não ter lido ainda A Peste e O Estrangeiro é aquele tipo de lapso que um bibliófilo só confessa baixinho. Já comecei no passado a ouvir a leitura de O Estrangeiro em francês, feita pelo próprio Camus, mas confesso que me distraio facilmente com áudio-livros. Achei que já era hora de ler os dois clássicos. E com uma vantagem: como ficam num mesmo tomo, eles valeram como um livro só na contagem da mala.

15. Pays Sans Chapeau, de Dany Laferrière
Ouvi falar desse livro há pelo menos uns sete anos numa reunião de amigos na casa dos meus pais. Pelo que pesquisei, ele não tem tradução para o português e meu francês não era bom o suficiente para encará-lo no idioma original. Quando comecei a ler os primeiros romances em francês, pedi que minha mãe trouxesse esse livro de viagem. O autor é haitiano e o “país sem chapéu” que aparece no título é sua terra natal. A curiosidade que tenho com esse livro vem sendo cozinhada há anos, espero não me desapontar.

Me conta: o que você tem lido ultimamente e o que está na sua lista de leituras futuras?

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  1. Vc vai gostar do Estrangeiro (penso que poderia lê-lo em francês, não é difícil ) e depois me conta o que achou da Rainha Ginga, que já li e gostei. Li recentemente "Charlotte" de David Foenkinos, muito bom! E meu desafio atual é a leitura em inglês de "All the light we cannot see", de Anthony Doerr, recomendado por uma livreira de Durham…Beijos e boa leitura.

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    1. Estou muito curiosa com "Rainha Ginga", acho que vai acabar sendo minha próxima leitura. Vou procurar esse "Charlotte", acho que você já tinha mencionado ele antes. Esse "All the light we cannot see" não conheço. Beijo

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  2. Gabriela, acho que você vai gostar: http://www.wdl.org/
    Bjs.

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    1. Obrigada pela dica, Fernando! Estou adorando o site, principalmente os mapas. Um beijo

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