{Meus atuais companheiros} |
Calculo que eu tenha hoje em dia
no apartamento do Rio cerca de 600 livros. Na casa dos meus pais devem estar
guardados outros 200 livros meus.
São estimativas bastante grosseiras e
acredito que a margem de erro jogaria esse número para cima, não para baixo.
Então, imagine escolher uma pequena quantidade desses livros para acompanhá-la(o)
durante um ano de moradia no exterior. Lógico que você sempre pode comprar
novos livros, mas quando se vai morar em uma cidade pequena de um país cuja
língua não se domina, mesmo as opções de livros importados são bastante
reduzidas. Logo, é preciso escolher, ao menos, quais serão as leituras que você
terá garantido para o período antes de encontrar uma livraria com acervo
decente em algum idioma conhecido.
Esse era o meu dilema quando tive
que botar minha vida em malas para serem despachadas para Erlangen. Para não
enlouquecer – ou pelo menos enlouquecer menos – estipulei um limite de 15
volumes. Sem me apegar aos meus preferidos, a principal regra era que fossem
todos livros que eu ainda não tivesse lido. É sobre eles (que aparecem na foto
acima) que pretendo falar hoje. Começarei da esquerda para a direita.
1. The Poppy, de Nicholas J.
Saunders
Comprei o livro na Austrália,
quando estava voltando de Timor-Leste. Confesso que papoulas são flores que me
impressionam muito. Em primeiro lugar, pelo seu simbolismo em relação à guerra:
por serem muito efêmeras e por existirem campos de papoula em alguns dos
lugares onde se travaram batalhas na Primeira Grande Guerra, elas são até hoje
usadas em lapelas ou desenhos para homenagear os soldados mortos. Em segundo
lugar, por ser a fonte de onde se retira a seiva para a produção do ópio (e
consequentemente de opiáceos como a morfina e heroína) é uma planta que fascina
e assusta, necessária para sanar a dor e combatida à foice em países como o
Afeganistão. Por tudo isso, fiquei curiosa em ler mais sobre a planta.
2. Peregrinação de Enmanuel
Jhesus, de Pedro Rosa Mendes
Na verdade, não sei muito sobre o
que é o livro. Porém, se você tentar pesquisar sobre livros ligados a
Timor-Leste, como fiz antes de visitar o país, este é um dos que primeiro
aparecerão na sua pesquisa. O autor é um jornalista português, que já foi chefe
da Agência Lusa em Timor e tem uma vasta experiência em áreas de conflito.
Alguns meses atrás acabei achando o livro na estante de uma livraria no Rio,
mas não era possível achá-lo quando o procurei pela primeira vez. O meu
exemplar comprei numa pequena livraria em Díli.
3. O Homem que Amava os Cachorros,
de Leonardo Padua
O livro fez enorme sucesso quando
foi lançado e o autor cubano deu algumas entrevistas inclusive para canais
brasileiros na época da publicação. Ele costuma ser muito elogiado pelos
leitores e se baseia num fato histórico, o assassinato de Trotsky no México,
para narrar histórias que envolvem o assassino. Ao que parece, vai se
aproveitando desse fio para repensar o próprio comunismo.
4. 18 Dias, de Matias Spektor
Comprei o livro logo que foi
lançado e ouvi falar até que foram feitas algumas modificações nas edições
posteriores. O autor é um dos grandes pesquisadores atuais de política externa
brasileira e escreve uma coluna para a Folha de São Paulo. Com esse currículo,
o tema ganha ainda mais peso: trata-se do relato dos movimentos feitos pelo
então governo Fernando Henrique Cardoso, logo após a vitória de Lula nas
eleições, para que os Estados Unidos recebessem bem o sucessor na presidência.
Ao que parece, a pesquisa para o livro contou com vários depoimentos do alto
escalão. Acho que é uma leitura interessante para qualquer um que queira
entender a política externa brasileira atual e os próprios mecanismos que regem
a construção de políticas externas de forma geral.
5. A Rainha Ginga, de José
Eduardo Agualusa
Depois de ler Milagrário Pessoal, cai de amores pelo
Agualusa. A Rainha Ginga é o romance
mais recente do autor angolano e envolve a personagem histórica que dá nome ao título.
Minha expectativa é enorme e, se você já leu qualquer coisa desse autor (que
escreve às segundas-feiras n’O Globo), deve imaginar como eu que a escrita
sedutora dele não pode dar em algo ruim. O livro parece trazer relatos de
aventuras fantásticas, ao ponto do autor falar em uma entrevista que, ao
descrever fatos reais insólitos, ficava com medo que as pessoas apontassem
justamente na realidade os exageros da história. Estou guardando a leitura do
livro como quem guarda o pedaço mais gostoso de um prato para a última garfada.
6. Construir al Enemigo, de
Umberto Eco
Outro critério que tentei usar na
escolha dos livros foi trazer ao menos um título em cada idioma que domino para
não perder a prática. Foi um pouco assim que este livro veio parar na seleção.
Ele foi comprado na minha última viagem a Bariloche, num impulso motivado pelo
título e pelo autor. Umberto Eco é um grande romancista (autor do famosíssimo O Nome da Rosa) e acadêmico na área de
semiótica. Alguns de seus livros, como Apocalípticos
e Integrados, são obrigatórios para qualquer pessoa que pretende estudar
comunicação a sério. Some-se a isso o fato de que a construção do inimigo, ou a
própria compreensão do que é o “eu” em contraposição ao “outro”, é um dos
principais temas de estudo de relações internacionais. Ou seja, este livro que
reúne textos dispersos de Eco mexe com grande parte daquilo que busquei estudar
durante minha vida acadêmica. Convenhamos que foi um impulso perdoável.
7. Pós-Guerra: uma história da
Europa desde 1945, de Tony Judt
Li dois capítulos deste livro
durante as aulas de História da faculdade de comunicação. Além de extremamente
interessante, é muito bem escrito. Passa por assuntos diretamente políticos,
como todo o encaminhamento para a abertura dos países do leste europeu no final
dos anos 80, até aspectos culturais, como o baby boom do pós-guerra e a
revolução cultural resultante de uma população majoritariamente jovem. Como ele
é um pequeno tijolo, a continuação da leitura foi sempre sendo adiada. Trouxe
na esperança de que a hora seja agora.
8. Serena, de Ian McEwan
Este livro veio na mala porque
era o que eu estava lendo no momento em que deixamos o Brasil. Se trata de um
romance de espionagem, um pouco aos moldes de O Fator Humano, de Graham Greene, em que o serviço secreto é mais
caracterizado pelo seu lado lento e burocrático do que pela agilidade da vida
glamorosa de espiões à la 007. Tenho sempre boa expectativa com tudo que é
escrito pelo Ian McEwan, mas o livro não me empolgou. Em parte, o aspecto que
achei mais interessante foi a descrição dos costumes da época, inclusive da
liberação sexual que a protagonista vai experimentando ao longo do livro.
Entretanto, esse tema é melhor retratado em outro romance do autor, o Na Praia, que se passa durante uma noite
de núpcias no começo dos anos 60. Da mesma forma, o ápice de Serena está na descoberta da metalinguagem
(estamos lendo um livro dentro de outro livro). Esse não é um recurso novo na
obra de McEwan; pelo contrário, é o ponto forte de Reparação, seu romance de maior sucesso. Porém, em Reparação, a revelação da metalinguagem
traz revelações sobre a trama que são arrebatadoras. Em Serena o efeito não é tão impactante, embora não deixe de ser bem
elaborado. Em resumo, não é um livro ruim, mas está longe de ser o melhor do
autor.
9. Gabriela Cravo e Canela,
de Jorge Amado
Antes de tudo, é preciso dizer
que fui batizada em homenagem ao romance. Meus pais queriam um nome "bem
brasileiro” e foi assim que me chamei Gabriela. Por isso, sempre tive
curiosidade com o livro. Um dia, procurando o exemplar que minha mãe disse ter
na biblioteca da casa dos meus pais, descobrimos que o livro havia sumido. Foi
quando me dei ao trabalho de comprar um para colocar no meu acervo, e lá ele
ficou sem receber muita atenção. Entretanto, sempre foi um livro que me
fascinou pelo contexto pessoal. Talvez seja justamente por isso que tenho medo
de lê-lo e me decepcionar. A história é velha conhecida de qualquer pessoa em
um país lusófono que tenha acesso à televisão. Minha curiosidade (e temor) é
saber como o livro conta a história já conhecida.
10. O Planeta dos Macacos, de
Pierre Boulle
Quando vi a versão para o cinema
dos anos 60 há uns dois anos, fiquei muito impressionada com a trama. É
extremamente inteligente e imediatamente pensei que, se o filme era tão bom, o
livro deveria ser ainda melhor. Algumas coisas me incomodavam por estarem mal
explicadas e, quando pesquisei sobre o livro, descobri que os problemas que via
na versão cinematográfica não se repetiam na obra original. Desde então,
comecei a querer o livro, mas pensava em comprá-lo em inglês (só depois me dei
conta de que o livro foi escrito originalmente em francês). Até que, não faz
muito tempo, dei de cara numa livraria com esta nova versão da obra de Pierre
Boulle em português. A nova edição traz a(o) leitor(a) uma entrevista e um perfil
do autor, assim como um posfácio que situa O
Planeta dos Macacos num contexto maior de produção de ficção científica. O
livro vale muito a pena pelo romance e pelos textos complementares. Pretendo
voltar a falar nele num futuro post.
Pensando no tema do livro, talvez
você goste de ler (ou reler) o texto “Macacos” publicado anteriormente aqui no
blog.
11. A Flecha de Deus, de
Chinua Achebe
Quando ouvi falar pela primeira
vez de Chinua Achebe em uma aula sobre África no mestrado, corri para comprar
alguns livros seus. O escritor nigeriano tem, além de romances, pelo menos um
livro de ensaios chamado A Educação de
Uma Criança Sob o Protetorado Britânico que é imperdível. É possível
encontrar muito eco de sua obra, assim como referências explícitas, no livro Americanah, da escritora nigeriana
contemporânea Chimamanda Adichie. A
Flecha de Deus fala sobre o choque de visões dos colonizadores ingleses e
dos moradores de uma aldeia nigeriana, que tentam entender uns aos outros para se
manterem no lugar, seja pela expansão ou pela sobrevivência. O enredo me
empolga bastante e a forma direta da escrita de Achebe deve fazer deste romance
um bom livro.
12. Contos do Nascer da Terra,
de Mia Couto
Na noite do último Natal, num
momento que estava na cozinha com meu tio ele me disse: “li um livro que tem
uma criança que toda vez que houve o final de uma história pergunta “e
depois?”. Lembrei de você quando era criança”. Quando ele me disse que era um
livro do Mia Couto, fiquei especialmente feliz. É sempre bom ser lembrada por
algo que nós mesmos admiramos. Pouco depois do meu aniversário, meu pai chegou
em casa com um exemplar de Contos do
Nascer da Terra. Era um presente enviado pelo meu tio. Não tenho muita
idéia sobre o enredo do livro, mas tenho certeza que vou adorar descobrir.
13. Solar, de Ian McEwan
O livro foi presente de um amigo
que tinha acabado de lê-lo e foi entregue com muitas recomendações positivas.
Pelo que entendi, trata-se da história de um cientista que estuda mudanças
climáticas e passa a maior parte do tempo mostrando as incongruências do
próprio raciocínio científico. Como adoro protagonistas cínicos, tem grande
chance de me empolgar. Porém, esse deve ficar no final da fila; no momento estou
dando um tempo de obras do Ian McEwan para variar um pouco.
14. A Peste & O Estrangeiro, de Albert Camus
Até hoje o único livro que li de
Camus foi o menos famoso, mas nem por isso menos certeiro, Os Justos. Não ter lido ainda A
Peste e O Estrangeiro é aquele
tipo de lapso que um bibliófilo só confessa baixinho. Já comecei no passado a
ouvir a leitura de O Estrangeiro em francês,
feita pelo próprio Camus, mas confesso que me distraio facilmente com
áudio-livros. Achei que já era hora de ler os dois clássicos. E com uma
vantagem: como ficam num mesmo tomo, eles valeram como um livro só na contagem
da mala.
15. Pays Sans Chapeau, de
Dany Laferrière
Ouvi falar desse livro há pelo
menos uns sete anos numa reunião de amigos na casa dos meus pais. Pelo que
pesquisei, ele não tem tradução para o português e meu francês não era bom o
suficiente para encará-lo no idioma original. Quando comecei a ler os primeiros
romances em francês, pedi que minha mãe trouxesse esse livro de viagem. O autor
é haitiano e o “país sem chapéu” que aparece no título é sua terra natal. A
curiosidade que tenho com esse livro vem sendo cozinhada há anos, espero não me
desapontar.
Me conta: o que você tem lido
ultimamente e o que está na sua lista de leituras futuras?
Vc vai gostar do Estrangeiro (penso que poderia lê-lo em francês, não é difícil ) e depois me conta o que achou da Rainha Ginga, que já li e gostei. Li recentemente "Charlotte" de David Foenkinos, muito bom! E meu desafio atual é a leitura em inglês de "All the light we cannot see", de Anthony Doerr, recomendado por uma livreira de Durham…Beijos e boa leitura.
ResponderExcluirEstou muito curiosa com "Rainha Ginga", acho que vai acabar sendo minha próxima leitura. Vou procurar esse "Charlotte", acho que você já tinha mencionado ele antes. Esse "All the light we cannot see" não conheço. Beijo
ExcluirGabriela, acho que você vai gostar: http://www.wdl.org/
ResponderExcluirBjs.
Obrigada pela dica, Fernando! Estou adorando o site, principalmente os mapas. Um beijo
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