sexta-feira, 7 de março de 2014

Bagagens: Timor-Leste II

{Saguão do Hotel Timor}

Entro no Hotel Timor pela enésima vez no curto tempo em que estou em Díli. É o primeiro lugar que qualquer pessoa menciona nessa terra para marcar um café ou um almoço. O restaurante do hotel funciona como principal lugar para ver e ser visto, algo como um Antiquarius entre o Sudeste Asiático e a Oceania.
A comida não depõe contra, tampouco a favor. De timorenses, praticamente só os funcionários. A maior parte dos locais parece não se aventurar aqui dentro, embora alguns possam ser vistos na cafeteria do prédio, no lado oposto do lobby. Todas as cabeças parecem se alvoroçar assim que alguém passa pela porta. Há ainda um detalhe que reforça a impressão de que a atmosfera pertence a outro tempo: é permitido fumar nas dependências do hotel e do restaurante. Lembro que já li essa cena antes num livro de George Orwell (e de Graham Greene, e de Chinua Achebe...).

“Em qualquer cidade da Índia, o Clube Europeu é a cidadela espiritual, a verdadeira sede do poder britânico, o nirvana pelo qual os funcionários públicos e os milionários nativos anseiam em vão. O que no caso se aplicava em dobro, porque o clube de Kyauktada orgulhava-se de praticamente ser o único na Birmânia a jamais ter admitido um membro oriental.” (Em Dias na Birmânia)

No dia seguinte à primeira vez que estive no famigerado restaurante, marquei um café com alguém que me ajudaria na minha pesquisa. Onde? No Hotel Timor, é claro. Assim que entro no carro, a pessoa, que nunca havia me visto na vida e com quem eu trocara apenas e-mails, pergunta:

- Você sabe onde é o Hotel Timor, não é? Você estava almoçando lá ontem.

Afirmo que sim e seguimos viagem. Só no dia seguinte me dou conta de que eu nunca havia mencionado a tal pessoa que estivera almoçando no Hotel Timor. Finalmente começo a entender um pouco como as coisas funcionam aqui.

Conto o caso para algumas pessoas com quem fiz amizade e conhecem Timor há muito mais tempo que eu. Resmungo que aquilo tudo parece coisa de cidade pequena. Todos têm a mesma resposta: “muito pior do que cidade pequena, isso aqui é uma ilha!”

Há toda uma particularidade na vida insular.

Deixe suas impressões
(sobre a vida, o universo e tudo mais):