terça-feira, 18 de novembro de 2014

A viagem dos outros

{Porto de Casablanca, no Marrocos, com a cidade ao fundo}


Antes da internet ser quase onipresente e quando as fotos ainda tinham que ser reveladas para saber se não estavam com o dedo do fotógrafo na frente da lente, existia muito mais expectativa em relação a viagens alheias. A bem da verdade, era também a época em que viajar era mais raro e um relato de viagem era uma oportunidade de visitar lugares em que jamais botaríamos os pés. Por isso tudo, quando alguém voltava de um lugar exótico ou paradisíaco, a gente tinha certeza que ia ter a oportunidade de ver um álbum de fotografia. Hoje em dia, acompanhamos quase que passo a passo as viagens de conhecidos (e nem tão conhecidos assim) pelas redes sociais.

Há pouco tempo aconteceu uma coisa engraçada: meus pais voltaram de uma viagem de um mês e meio no mesmo dia em que André partiu para a Itália. André tem acesso constante à internet, enquanto os meus pais, visitando cidades pequenas e depois "confinados" em um navio com internet a preços exorbitantes, pouco acessaram o mundo virtual. Fato é que a conectividade constante permite que eu acompanhe quase em tempo real o que o André faz. A cada coisa que ele vê e acha que eu vou gostar, recebo uma mensagem com uma foto, o que é uma delícia, porque vai matando a saudade. Por outro lado, só soube da viagem dos meus pais quando eles chegaram. Nos falávamos por telefone, mas não dava tempo de comentar tudo que haviam visto e vivido nos rápidos contatos. Assim, no fim de semana passado ouvi histórias da Suíça ao Marrocos. E há alguma coisa nisso, de parar para ouvir sobre uma viagem, que a instantaneidade virtual atropela. (Para que não haja mal-entendidos, quem sou eu para menosprezar a internet! Afinal, é graças a ela que estamos conversando aqui, agora. Só acho que deve ser algo complementar às conversas ao vivo sem hora para acabar, e não um substituto.) 

Lembro de uma vez que precisei fazer um trabalho sobre o Egito para o colégio, quando eu tinha uns 11 anos. Lembrei de uma amiga da minha mãe que viajava o mundo todo e cujas histórias eu havia escutado num jantar. Imaginei que ela já devia ter ido ao Egito e pedi que ela deixasse eu xerocar umas fotos para ilustrar meu trabalho. Deu certo e, como tudo que é próximo d'a gente é mais marcante, aprendi mais sobre o Egito do que se tivesse apenas consultado uma enciclopédia qualquer. Essa semana uma amiga aproveitou alguns dias de folga para conhecer o Cairo e a costa do Mar Vermelho e fui acompanhando a viagem em tempo real por nossas conversas na internet. Outros tempos, outra forma de viajar na viagem alheia.

Porém, a verdade é que anda batendo um saudosismo dessa expectativa que era ouvir por anos uma história até poder ver com os próprios olhos um determinado lugar. Alguns lugares são marcantes para mim nesse aspecto. O primeiro era o Peru, o único país que meu pai visitou e minha mãe não. O fato de ele ser o único na casa a conhecer Lima criava uma curiosidade ainda maior sobre a capital peruana. E como ele sempre falava do Museu do Ouro do Peru, coloquei na cabeça que um dia iria lá a qualquer custo. Assim foi. E para dizer a verdade, nem era o museu mais bonito de Lima, tão pouco o museu do ouro mais bonito da região (como já falei aqui, o museu de Bogotá é especialmente bonito). Mas não importa, era o museu do qual meu pai falou por anos. Da mesma forma, meu pai sempre falava de Washington DC, para onde foi a trabalho, também sozinho. O problema é que ao contrário do meu pai, que foi até lá na primavera, fui no outono, e não vi as cerejeiras em flor. Não tem problema, um dia volto nas duas semanas em que a cidade fica toda florida em tons de rosa.

Agora, pelos relatos da minha mãe, não vejo a hora de ir a Casablanca.

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  1. Eu viajei um pouco em Asmara, na semana passada. Graças a você, um livro e uma amiga francesa que mora lá. Amo as viagens dos outros, elas acabam virando um pouco nossas também. Esse blog é um concentrado de viagens alheias. Obrigada!

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    1. Que bom, Sandra! Agora sou eu que estou viajando em Asmara e nossas conversas tornaram a viagem ainda mais profunda e interessante. Fico feliz que você veja o blog como um compêndio de viagens para (re)fazermos juntos. A idéia é mesmo essa.

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